quarta-feira, 20 de junho de 2012


Quando chegaste naquela caixinha tão grande para um corpo tão pequeno, ainda que pequena para uma ternura tão grande, sabia que teria de fazer alguma coisa por ti. E foi assim, que em segundos, te acercaste do meu coração.

Peguei -te e preencheste rapidamente a minha mão. De facto, não é de forma nenhuma o nosso tamanho que diz de nós, senão o nosso coração. E o teu queria voar, queria voar tanto!
Percebi logo que estavas doente. O teu corpo débil deixava passar bactérias para as minhas mãos, enquanto eu tentava limpar-te destes males de que sofrias. Estavas com medo, tentavas libertar-te, esvoaçavas, tímido, querias fugir. Por vezes fechavas os olhos e eu olhava-te, curiosa, preocupada, sem saber como ajudar-te.
Tentei alimentar-te, juro que tentei. Dei-te água, mas o teu bico custava a abrir-se, como que a desistir de beber da transparência que dá força ao albergue que um dia foi teu. Forcei-te um pouquinho, pedi que não desistisses, não agora, e umas gotas caíram por ti. Mas não foi suficiente para que te alimentasses em prol da tua sobrevivência.

Eu não queria desistir contigo. Não! Tu lembravas-me. A tua vontade tão grande de querer, de te pores de pé, demonstrando uma força enorme mesclada com uma fragilidade maior ainda, que se encobria por debaixo desse desejo de voar...

Disseram-me que se fosses diferente, talvez pudesses sobreviver.

E eu? E eu que venho do nada mas sinto ter tudo, como tu, que também quero voar e ser, que também quero tanto viver e ser feliz, e eu? E nós?

Desculpa-me por não ter tido a coragem de te fazer companhia nos teus últimos momentos. Talvez quisesses dizer-me algo, abrir as asas pela última vez, alimentar-te de miminhos. Não consegui ver-te sofrer! Mas juro-te que rezei por ti. E pedi por ti, por nós.
Fui covarde, eu sei, talvez seja esse sangue frio que me falta. Perdoa-me por o meu coração ser tão quente! Perdoa-me, desculpa-me.

Agora, só resto eu. Tu já voas no paraíso! E enquanto não nos encontramos, não vou desistir de abrir as minhas asas e ser tudo aquilo que quiser. Tal como tu, não me vou abandonar. Nem que para isso me tenha que aguentar dentro de mim… Até que o sonho me eleve a alma. Todos temos direito a voar!

“A esperança tem asas. Faz a alma voar. Canta a melodia mesmo sem saber a letra. E nunca desiste. Nunca.” 
Emily Dickinson











sábado, 25 de fevereiro de 2012

Espelho

Olho-me ao espelho e vejo nele o que os meus olhos sentem. Às vezes, simpatia, sedução, beleza. Outras, sensibilidade, leveza, eternidade de uma criancice absoluta. Às vezes tento olhar melhor, bem dentro das pupilas dilatas de tanto desejo, e encontro a maturidade e realização que quero ter. Ou será que tenho?
Quem sou eu afinal? - Pergunto-me. E faço-o tantas vezes que o espelho fica baço de desejo, de curiosidade, de vontade de mim.
Limpo a humidade que vai na alma e fecho os olhos, desta vez. Poderei ver o meu reflexo na absorção de um coração que muitas vezes não entende por que bater? Ou serei apenas e só o pulsar de instintos audazes que me preenchem por fora?
Na verdade, eu não sei. E se sei, teimo em não querer dizer.
Não seremos nós isso mesmo? A imagem distraída daqueles que querem mais de nós do que lhes queremos dar? Um suspiro, um abraço, um desabafo lacrimejado de confissões que nem nós próprios julgamos dizer?
Nada dura para sempre. Nem mesmo estas capas, que apesar de rompidas, velhas de nós, teimamos em usar. E um dia – porque ele chega sempre – somos um bocadinho de nós mesmos, num sopro de amor e simplicidade humana.
Quem me dera que este dia durasse para sempre! Assim, conhecer-te-ia espelhada(o) na realidade que és e poderia ver em ti, o reflexo que teimo esconder de mim.



“Esforço-me por descobrir a força de fugir à norma, de ser o Monstro que a vida nos torna”
(Bezegol)