sexta-feira, 16 de dezembro de 2011


Ela tem cabelo azul farto de rastas e usa o preto como preferência.

Não gosta de música pop, de telenovelas, não sabe fazer croché nem cozinhar. Dos poucos amigos que tem, conta-se uma rapariga. Não dá azo a simpatias nem faz festas nos amigos, prefere faze-las com eles.
Do muito que tem, nada lhe sobra. È irreverente, provocante e perita em incomodar as avozinhas. Põe a música nas alturas às 4 d...a manhã, e faz-se de despercebida quando a policia lhe bate á porta.
È controversa, cínica e por vezes egoísta. Trata por tu a solidão, ignora horários, falta às aulas, comete infracções.
Ela é detestada por metade da escola e ignora a outra metade.
Maluca, esquisita, punk, def, escumalha, ridícula, extraterrestre – são alguns dos nomes que se habituou a ter.
Em casa, nada lhe falta, diz-lhe a mãe. Uma família de renome, classe de doutorados, desafogados de problemas financeiros, sem problemas de maior. Foi a única que saiu diferente, queixa-se o pai. Das irmãs, nenhuma lhe fala sem que se consiga denotar a arrogância e a superioridade.
Mas para ela pouco importa. Um dia todos compreenderão! Esperança ténue de uma visão ampliada do seu mundo.

E é por isso que a admiro tanto.

È vaiada, gozada, motivo de risota diária. Mas mesmo assim levanta a cabeça, ri-se para dentro e deixa que os phones lhes silenciem os disparates. Por muito que façam, que digam, que apontem, ela continua impávida e serena: negra por fora, colorida por dentro!
Pouco lhe importa o que os outros acham. Porque ela, ao contrário de muitos, sabe quem é.
E sabe que, apesar do que aparenta exteriormente, segue o coração como ninguém. Em segredo, é romântica, escreve poemas, faz doações anónimas da sua mesada a instituições da caridade.
Dá vontade de perguntar o porquê daquele jeito tão afastado do mundo, tão longe do normal. E ela responde.

“Eu sou quem sou, como sou. Pouco me importa o que os outros pensam! Só terá o direito de entrar na minha vida e no meu coração quem souber ler-me no olhar, muito para além das minhas vestes. Nunca saberás a verdadeira cor do mar, se não o visitares na sua profundidade.”

È por isso que a admiro tanto.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O meu abrigo

      Estou sentado na soleira da porta, que também faz de minha almofada durante a noite.

     Aqui, no coração saudoso do Porto, vivo os meus dias coleccionando pedaços de sentimentos, bocadinhos das pessoas que vão passando, que se perdem sem elas darem conta. Pertencem-me os risos das crianças, os gritos dos trajados que comandam magotes, o espanto dos turistas que percorrem este lugar esquecido, o calor de um cachecol luxuoso no pescoço de uma senhora bem-posta. Todos os dias, ganho prémios de consolação. Alheio aos olhares que falam, às mudanças de passeios, à frieza nas palavras de quem não me vê para além de um sem-abrigo, vejo nas pessoas o que elas não vêm para além do espelho. Talvez tenha aprendido a vê-las por olhar tanto para mim, que já fui igual aos outros.
     Eles dizem que não sou nada mas eu sei que represento tudo. Não é a roupa que trago, que me veste. Do que como, nada me sabe às sobras que consigo do lixo, tão pouco bebo da água que vai caído em pingas, do telhado para o copo velho que tenho a meu lado. As pessoas não sabem, não sabem porque não querem, desconhecem porque têm medo, mas eu tenho tudo. Trago comigo as memórias de um outro eu, que vivia provido de tudo o que queria. Carrego as lembranças de uma família que me esqueceu, das viagens que fiz, dos negócios que tive. Meti tudo numa caixinha de cor apagada, fechei-a bem, e transporto-a comigo para onde for, para que nunca me esqueça do orgulho que tenho pelo que sou agora. Talvez estejas espantado por tudo isto e me chames louco como os demais, mas ouve-me agora, que nada mais digo do que a verdade:

Eu tenho tudo.

     E foi o que deixei para trás que me fez encontrar quem eu sou hoje. Se assim não fosse, talvez não soubesse tanto de mim, de ti, de nós, agora. E foi isso que me fez dar tanto valor ao que sou, ao invés de dar valor ao que tinha. Perdi, perdi tudo. Mas ganhei-me. Durmo na rua, falo sozinho, sou maltratado. Mas antes não era pior? Tanta gente e ninguém me ouvia, vivia sozinho, mergulhado nas minhas preocupações supérfluas, magoavam-me tantas vezes que ainda sinto as cicatrizes…

Agora vejo a vida de outra forma.

     Não, não quero que tenhas pena. Só quero que dês uma oportunidade a ti mesmo, tal como eu fiz comigo. Que te conheças, que te aceites, que te possuas, em vez de tentares conhecer os outros antes, de aceitares o mundo como ele é quando podes fazer melhor, que sejas dono de ti mesmo em vez de detentor de carros de marca e casas á beira-mar.

     Hoje, eu olho para as pessoas e vejo-as por dentro. Porque me tornei transparente aos meus olhos, à minha cabeça e ao meu coração!
     Nesta soleira da porta onde me encontro sentado, permanece um homem que Vive. Sou um sem-abrigo abrigado por mim mesmo, que quer que a sua história não se repita na tua vida.

Não esperes, começa agora!

Pensa nisto.

Um dia, Talvez.

Um dia, gostava de perder essa mania teimosa de me preocupar tanto com os outros.

Poder viver a minha vida sem preocupações alheias na cabeça, tentando engendrar planos para que as pessoas possam viver melhor, ser mais, conhecerem-se melhor, fazerem as suas escolhas de acordo com o coração e umas pitadas de racionalidade.
Talvez até seja um objectivo convicto que esteja intrinsecamente ligado a m...im, pronto para se revelar um dia.

Sim. Um dia, talvez.

Porque na verdade sinto-me muito bem assim. Ajudar os outros em busca do auto-conhecimento é neste momento o que faz mais sentido para mim. Desde que me descobri que todo o trabalho que tenho vindo a realizar passa por ti. Haverá alegria maior do que a de dever cumprido, quando se estampa um sorriso nos outros e se vêem assim, na felicidade alheia, agradecidas todas as palavras embora maçadoras, chatas, confusas e muitas vezes dolorosas, que apesar de tentarem sair à mesma velocidade que entraram, nunca serão em vão?!

Às vezes tenho medo.

Eu sei que por muito que aprenda e por mais sede que tenha em saber mais, chegará sempre alguém pronto para uma conversa em jeito de pedido que não vou saber comentar. Há muitas situações com as quais não sei lidar, palavras que por as compreender tão bem, não conseguirei abafar em ti. Desculpa. Mas também eu estou a aprender, conhecendo-me mais de cada vez que falo contigo, da cada vez que percebo o que sentes quando escrevo um texto e me dizes em tom de desabafo que foi feito para ti. Na verdade, és igual a mim. Eu vejo-me em cada pessoa que falo, em cada partilha, em cada um que me procura. E talvez por isso te dê tanto valor. Por gostar demasiado de mim, vou-te estimando o melhor que sei. Não quero ver-te sofrer, chorar, esconder-te. Não quero que soltes os teus gritos num cântico mudo, que vivas guiada por uma luz que não queres, que não escolheste, que não te ilumina o caminho que sonhas.

Eu tomei a minha decisão e hei-de dedicar-me a ti, até que surja “Um Dia, Talvez” que me impeça de acreditar que é possível.

Eu escolho-nos.

E tu?

Desistes ou entras comigo nesta longa e sofrida batalha, de onde sairemos de mãos dadas, empunhando a bandeira da felicidade?!

Não estou preparada para te dar todas as respostas que desejas, mas dar-te-ei as que sei. Tão pouco poderei fazer com que os teus problemas desapareçam, mas posso faze-los fugir de vez em quando.
Eu quero mesmo é ser feliz, sempre. Eu quero aprender contigo, guerreira de uma vida!


sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Coisas de dentro

Não sei de que é feito o meu coração.


Tem dias que me parece ser de chocolate. Basta um raio de sol e fica todinho derretido!

Às vezes parece-me que é feito de chapa. Pouca coisa o atinge, mas quando acontece... Faz ricochete!Noutras alturas é água. Limpida e cristalina, que me lava interiormente.
Também já foi de sangue. E doeu tanto!
Quando foi fogo, queimei-me. Ardeu também quem nele tocou...
Mas do que eu mais gosto é quando ele é feito de goma. Doce, colorido, eterna criança!

Hoje, não sei de que é feito o meu coração. Nem sequer se o trouxe comigo.
Talvez se tenha perdido por aí.
Ou poder-se-á ter transformado em pedra, gelado, com o frio que me corre cá dentro...
Hoje não sei do meu coração. Se alguém mo tirou, ou se o abandonei. Não sei onde o procurar nem como o encontrar.

E percebo que o meu coração não é meu. È do mundo, de quem dele precisar, dos que o ocupam e se ocupam dele. Da tristeza, do amor, da alegria e da ambição.
È da familia, dos amigos, de quem nele entrar e for benvindo.
O meu coração não tem morada. Permanece nómada, deambulando por aí.
Se lhe quiseres falar, ele poderá não te ouvir. Mas quando mais precisares... Ele estará presente!

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Ja o vejo!

Quando menos se espera lá vem ele: Ninguem o quer, todos o temem, mas ele lá entra destemido, pela nossa casa dentro e ainda espera que gostemos da sua visita. Todos o tentam expulsar, fazer com que ele saia pela mesma porta por onde entrou, e praguejamos que não nos volte a incomodar, que nunca mais o queremos ver.

Mas ele permanece ali, inquieto mas persistente.

E está a querer entrar em minha casa! Já o consigo ver, do outro lado da rua.

Olho á minha volta e vejo o que ele fez nas outras casas: Destruiu familias, modificou pessoas, levou-as à loucura, tirou-lhes o que tinham e a muitas outras o que não tinham. Causador de tristezas, medos, sonhos quebrados. Ninguem o quer, todos o odeiam!

Mas não vou deixar que faça isso comigo! Não o posso expulsar da minha casa mas posso lutar contra ele. Ele quer fechar-me a porta mas preparo-me para abrir muitas janelas, para que ele possa pular e desaparecer quando notar que não o temo.
Já arregacei as mangas e preparo-me para ir á luta.
Não vai ser fácil: Ele tem a pujança, a experiência, é um destruidor por natureza.
Mas eu não me fico: tenho a inteligência, a perserverança, a vontade, os dons, a fé!

Por enquanto, e por precalço, começo por dizer: EMPREGO PRECISA-SE!

Ele, o senhor Desemprego, reles e antipático já se vai mostrando.
Mas eu digo-lhe: Tu podes ganhar esta batalha mas quem ganha a guerra sou eu!
Ah, podem ter a certeza que sim.


sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

´¯`•.¸¸. Nas asas de uma borboleta Ƹ̵̡Ӝ̵̨̄Ʒ

“Depois do acasalamento, as fêmeas buscam plantas adequadas para colocarem seus ovos.
(...) a fêmea sente a textura das folhas das plantas (...) a temperatura, a presença de ovos de outros insectos ou a disponibilidade de alimentos. Após algum tempo, os ovos eclodem e deles saem lagartas (...)
As lagartas comem o dia todo e até mesmo durante a noite. Nos momentos em que não estão comendo, recolhem-se nos ninhos que fazem na parte inferior de uma folha especial: a única folha que evitam comer. Já bem alimentadas com os nutrientes necessários, elas passam à fase conhecida como pupa.
(...) Esta capa, que acaba sendo sua protecção, dura até que ela atinja a fase adulta.
(...) Quando o casulo se rompe, sai dele a borboleta adulta, com corpo e asas inteiramente formados. Esperam mais algumas horas para que as asas sequem e endureçam e então... podem voar!”
Denise Moraes, In Vivo


Quando nasci, os meus pais procuraram dar-me tudo o que podiam. Talvez quisessem mais para mim, mas as suas posses delimitaram que viveria sem grandes artefactos. Cresci alimentada pelas informações que ia retendo. Brinquei, conheci, aprendi com tudo aquilo que me era colocado no caminho, fazendo de cada dia uma lição. Consumi da cultura que me iam mostrando, bebi de cada dia que me fez crescer... Mas ás vezes, dava-me uma vontade imensa de fugir, de me esquecer, esconder-me do mundo e refugiava-me no meu quarto, onde ficava durante horas a fio.
Na verdade, e apesar de todas as pessoas que me ocupavam o meu coração, de toda a família que me circundava, de adorar o lugar onde vivia, eu queria mais. Chamavam-me sonhadora, exagerada, idealista. Discutiam, criticavam, impediam-me. Depois de muitas tentativas frustradas para assumir uma identidade diferente daquela que todos esperavam, percebi que o segredo estava em saber esperar. Até encontrar forças para lutar, não conseguiria escapar ás índoles naturais de quem me viu crescer. Mas se eu não podia ser quem eu queria, também não iria ser o que esperavam.
Eu já não era eu.
Vivia acostumando-me aos meus próprios erros, às minhas falhas, aos fracassos de amores não correspondidos. E fechei-me dentro de mim, assumindo-me como refúgio de um mundo que não escolhi. Um dia, iria ser quem eu ambicionara. E coabitava com a esperança de poder vir a ser o que queria, de voar mais alto do que os outros alguma vez pensariam voar.

Numa manhã clara de primavera, senti um rasgo de luz afectar-me a visão, enublada de uma noite passada entre o choro e a decepção. Acordei decidida a mostra-me ao mundo como era, de uma vez por todas. Tinha ficado anos naquele casulo que era o meu quarto, à espera de um sinal que eu própria sabia não existir. Estava decidida a virar a minha vida do avesso, que é o lado que prefiro.

Coloquei-me em frente ao espelho e sorri. Os cabelos, cortados com a primeira tesoura que encontrei, condiziam com as cores vivas da minha vestimenta. Pela primeira vez, senti que todos os quereres do meu coração tinham força para se libertarem e crescerem soltos e desatados do meu passado.
Convoquei uma reunião com o meu coração, de onde demiti muita gente que lá estava fazia anos. Foram embora sem direitos! Mergulhei a minha cabeça no mais quente dos sentimentos e expulsei de uma vez todos os pensamentos que se tinham ocupado dela.
À minha volta, observei todas as pessoas que me olhavam com cara de nada, valendo coisa nenhuma. Tantos risos, tantos choros, tudo falso! Soltei uma gargalhada e agradeci por ser diferente de todos os outros. Não me despedi, não acenei, não olhei para trás. Corri para a janela, debrucei-me, olhei o infinito e...

O primeiro voo de uma borboleta é algo único.

È a prova de que todos, sem excepção, conseguem atingir os objectivos, embora este seja um percurso com sacrifícios, dores e sofrimentos, mas vale muito a pena.
Hoje, estou a voar por entre as nuvens.
È realmente compensador sonhar e ser, pensar e querer, fazer por isso!

Espero que, tal como eu, tenhas a coragem de mudar o teu rumo e vires voar comigo!


A vida é muito curta. Curta de mais para ser pequena.